terça-feira, 8 de julho de 2014

Eu sou brasileira, com muito orgulho, com muito amor...



Desde que a Copa do Mundo começou, eu queria escrever.... Algum bichinho aqui dentro, entretanto, me dizia para esperar...Chegou a hora!
São várias reflexões, alguns questionamentos, certezas que nasceram, dúvidas que surgiram...E o desejo de partilhar com vocês o que ficou. Hoje, no trabalho, eu falei para alguns líderes que “o mundo da retórica deu lugar ao mundo da síntese”, mas peço desculpas a todos, pois aqui o que vou usar é a retórica. Fica o desafio de ler até o fim....rs.....
Antes de qualquer coisa, quero dizer com toda verdade de meu coração que o que estou escrevendo é o que penso e sinto. Respeito outras opiniões e outras percepções. Sei que muitas vezes falo e escrevo com uma entonação que pode parecer que sou a dona da verdade, mas falo o que acredito, o que é verdade PARA MIM. Não acredito na verdade absoluta, por isso acho muito legal esse espaço de liberdade onde cada um pode, ao mesmo tempo, expressar e receber a “verdade” de cada um, sabendo que todas são relativas.
 A primeira coisa que eu quero resgatar é o que falei desde o início: consciência política é consciência política, esporte é esporte. Não acho legal misturar as coisas. Não quero trazer aqui as críticas e questionamentos sobre a realização do Copa no Brasil e os interesses políticos que permearam nossa história, desde a decisão até a realização da Copa. Como a maioria dos brasileiros, concordo que temos outras prioridades, mas não é essa a tônica do que quero falar.
Acho a Copa do mundo um evento muito legal: a reunião de famílias, de amigos, a alegria e o sofrimento comum, o esporte assumindo um papel importante (que ele deve sempre ter) na vida das pessoas. Eu falei importante, não fundamental. Não adianta a gente querer que o povo deixe de curtir os jogos de futebol, não adianta ficar repetindo que é “tudo pão e circo”. Gostamos de futebol! Podemos continuar gostando de futebol, não tem nada de errado nisso. Povos cultos e educados também gostam de futebol. Na minha cabeça, uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Acho muito legal também ver o povo cantando junto o hino nacional, esse sentimento de sermos “brasileiros com muito orgulho e com muito amor”, mas isso eu comento depois.
Aí vem o jogo de hoje: uma derrota inacreditável! Nenhum de nós esperava por aquilo... Mas o pior, para mim, não aconteceu dentro do campo, mas fora. O pior foi ver os jornalistas dizerem que o jogo foi a maior humilhação que o Brasil já passou em sua história, que vivemos uma vergonha nacional e que as crianças jamais vão esquecer a tragédia deste dia....Com certeza foi um dia crítico, mas um dia crítico para o FUTEBOL brasileiro, não para a história do país! Pelo amor de Deus.... Depois as pessoas ficam chamando os jogadores de chorões e descompensados... Como não ficar assim diante do papel de super-heróis e da responsabilidade de “salvar” o país que se colocou sobre eles? Eles são apenas jogadores de futebol! Eles jogaram mal, sim. Não estou aqui com lentes cor-de-rosa para dizer que eles jogaram bem e perderam por azar. Eles perderam porque jogaram mal e, por outro lado, a seleção alemã jogou muito bem. Eles perderam porque se descompensaram, sim.... Mas será que algum de nós não teria se descompensado em situação semelhante?  Como a maioria dos brasileiros, fiquei triste e decepcionada.... Aaaahhh, seria tão legal levantar a taça no Maracanã.... Mas longe de ter ficado arrasada ou com raiva dos jogadores, muito menos sentindo vergonha.... Vergonha de quê? Perdemos de 7 a 1. Ponto.
Outras reflexões:
Não entendo muito de futebol, de táticas e técnicas. Não entendo nada da política que corre por trás de uma Copa do Mundo (nem quero entender), mas do pouco que entendo de gente e da paixão que tenho pelo ser humano, algumas coisas ficam reverberando no meu coração. A primeira delas é o exercício da empatia...Colocar-me no lugar desses meninos que estavam no campo. Sim, meninos! Os personagens dessa história têm, em média, 25 anos. É uma das seleções mais jovens da Copa. A maioria deles vêm de família pobre, cada um com sua história. Cada um já esteve do outro lado, passando por situações difíceis no seu dia a dia e se deslumbrando com os jogos da Seleção. Hoje se veem do lado de quem escreve a história (do futebol!). Imagino-os transbordando de desejo de dar ao povo – que eles conhecem tão bem – a alegria da vitória. Estou falando aqui na esfera dos “sonhos”. Na camisa de cada um deles estava o peso da realização de um sonho dos brasileiros.... Que coisa maluca, mas tão verdadeira! E, num país como o nosso, em que o coração pulsa em todas as células do corpo, não teria como ser diferente...Não nesse momento!
Abro aqui um parêntese para falar dos altos salários que recebem como jogadores profissionais nos times em que atuam. Eu sou a primeira a criticar a distorção do que é pago a um jogador de futebol e a um médico ou a um professor...E aqui não estou falando de Brasil, até porque não é o Brasil, o país que faz essas grandes distorções, mas sim, os países mais educados e cultos do mundo...Ironia.... Países que hoje conhecem a dor do desemprego tanto quanto nós. Li uma reportagem que dizia que 70% da população ativa da Espanha está desempregada. Justamente o país do Barcelona, do Real Madrid.... Não quero entrar nesta seara, foi mesmo só um parêntese. O que eu queria, nesse parêntese, era trazer o questionamento sobre a responsabilidade de quem paga, mais do que de quem recebe. A quem recebe, cabe a responsabilidade de usar bem o que ganha, sabendo direcionar o possível para o bem comum. Eu não sei o que cada um faz com o que ganha, por isso, não vou julgar. Também não conheço ninguém que se recebesse a oferta de um salário astronômico diria que não quer. Conheço, sim, muitas pessoas que aceitariam e direcionaria 90% de tudo para o social. Resumindo: o absurdo é pagar salários astronômicos, receber não é pecado! Mas isso também é papo para mais de metro, assunto para outro texto, talvez....rs....
Voltando....
Como já escrevi demais (avisei antes!), vou pontuar algumas coisas em tópicos:
1.       Já vi, em outras Copas, o povo criticando os jogadores por jogarem de “salto alto”. Não vi isso nessa seleção. Vi coração pulsando na ponta de cada chuteira. Vi um time jogando com garra, com vontade, com “propósito”. Agora criticamos o excesso de emoção....Somos assim!
2.       Somos latino-americanos, é fato. Somos um povo com a emoção a flor da pele. Não crucifico os jogadores por terem chorado depois da pressão do jogo contra o Chile. São humanos. Já vi muita gente chorar depois de realizar um objetivo que parecia impossível. Não condeno os jogadores por terem dado caruara depois de tomarem 4 gols em seis minutos... Não achei natural, não fiquei tranquila, achando que estava tudo certo. Óbvio que não! Fiquei triste e decepcionada também, mas não consegui deixar de me colocar no lugar deles. Há cerca de 3 anos, mais ou menos, fez-se a opção de iniciar um trabalho com uma nova seleção. Zerar tudo e começar a preparar um time. Todo mundo sabia que a escolha era essa e a escolha tem seu preço. Não dá para querer exigir desses meninos, a maturidade que nós desejamos que tenham. Não dá para cobrar um resultado sem a preparação necessária. Essa paulada os fará amadurecer e trará um aprendizado inenarrável. Que eles saibam aproveitar e crescer.
3.        Hoje, numa reunião de trabalho falávamos sobre o erro, sobre a importância de errar para aprender.... O erro aconteceu...E um erro grave. E agora? Fazer o que com isso? Se em campo, no futebol, eles deixaram MUITO a desejar, ao saírem do campo, na minha opinião, foram nota dez: não colocaram a culpa em ninguém, não fugiram à responsabilidade, pediram desculpas ao povo brasileiro e, mesmo arrasados, levantaram a cabeça e aplaudiram a torcida. Não vai resolver o problema, não vai mudar o curso da história, mas vai mostrar que se pode perder com dignidade. Por outro lado, a torcida, mesmo arrasada e decepcionada, mesmo tendo gritado olé em vários momentos do jogo, respondeu as palmas dos jogadores cantando “eu sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor”
4.       Contrária à opinião de muitos, eu vi nesse time, um grupo. Vi vínculos criados, vi objetivo comum. A questão é que não é um grupo pronto, mas um grupo em formação. Precisa ainda muito aprender, muito praticar para criar o entrosamento necessário. A equipe da Alemanha trabalha junto há 6 anos. Vi nessa seleção entrega e trabalho, vi seriedade e comprometimento. Estou dizendo isso na perspectiva da profissão que escolheram, não de salvadores da pátria.
5.       Contrariando novamente a opinião de muitos, para mim, Felipão é um exemplo de líder. Ainda vou recuperar a entrevista que ele deu depois do jogo para trabalhar suas palavras com as lideranças com que trabalho. Não sei nada de sua competência técnica, mas já acho muito legal ele fazer uma dobradinha com Parreira que, de cara, tem um estilo bem diferente do dele. Como líder de pessoas, eu tiro o chapéu para ele. E hoje, depois do jogo, ele agiu exatamente como eu considero que um verdadeiro líder deve agir.
6.       O esporte é um dos meios mais eficazes de promover a educação. Através do esporte, muito se pode fazer. O esporte e a arte são, na minha opinião, dois instrumentos importantíssimos no resgate da dignidade e da autoestima das pessoas e ensinam muito. Talvez, um dos aprendizados da Copa seja o de olhar para TODOS os esportes e não apenas para o futebol e investir em todos, não como formadores de super heróis, como fábrica de milionários ou de salvadores da pátria, mas como meios efetivos de encarar a vida sob outra perspectiva. Falando nisso, alguém sabia que Thiago Pereira ganhou medalha de outro na natação hoje?
7.       Para terminar os tópicos, só uma observação: eu fiquei chocada com a agressividade que vi rolando nas redes sociais... Acho legal o bom humor, aquela velha história de fazer limonada dos limões mais azedos.... Eu mesma sempre posto algumas brincadeiras, acho saudável. Mais vi alguns excessos que me incomodaram e, confesso, me deixaram mais triste do que a partida em si.

Bem, foi só um jogo de futebol...Com certeza, apenas um jogo de futebol. Mas foi um “evento” que mobilizou o país inteiro. Tudo o que mobiliza merece atenção, merece reflexão. Tudo o que mobiliza, ensina. Claro, ensina a quem se dispõe a aprender. E cada um aprende o que quer aprender. Espero que aprendamos muito, não apenas com esses 7 a 1, mas com tudo o que aconteceu nesses dias, o comportamento dos atletas e o comportamento da gente....
Para terminar, um pedido: não vamos fazer eco dessa história de que somos o cocô do cavalo do bandido e os alemães são os maravilhosos. Vamos acabar com essa história de que os alemães são pessoas sérias e trabalhadoras e nós somos malandros e seguidores da lei de Gerson.... O que é isso, minha gente? Não que não seja verdade a parte que compete a eles, mas não é possível que nos enxerguemos dessa forma, indistintamente. Colocamos um chapéu em nossas cabeças e assumimos esse personagem do malandro sem escrúpulos indistintamente? Não, por favor! Temos muita gente fazendo mal a nosso país, sim, mas temos muita gente competente, ralando, trabalhando e dando resultados sérios e importantes para nossa sociedade. Temos pessoas corruptas, mas temos muita gente do bem.... Enquanto nós, brasileiros, nos julgarmos assim, continuaremos morando no quintal do mundo. Não se trata de colorir a realidade, mas de dar a ela, a dimensão que ela tem. Por favor, nós, os brasileiros, não somos o que andam dizendo por aí.... Se na nossa cesta existem laranjas podres, nela também existem laranjas suculentas e capazes de alimentar a muitos.


Renata Villela