terça-feira, 5 de dezembro de 2017

Mensagem de Natal


2017 vai se pondo, abrindo espaço para que 2018 ocupe seu lugar com todo brilho de um ano que amanhece. Fico pensando que a criação do calendário, apesar de ser uma criação humana, foi – com certeza – uma inspiração divina. Deus sabia de nossa necessidade de fechar ciclos para iniciar outros e, quando dezembro chega trazendo com ele o finzinho de nossas forças, vem a celebração do Natal.
É o Natal (o verdadeiro!) que nos convida a arrumar nossos corações para que o Amor nasça. E Ele nasce pequenino, na simplicidade do que há de mais bonito na vida. Sim, porque engana-se quem imagina que a beleza da vida e a felicidade verdadeira encontram-se nos grandes momentos, nas aquisições mais caras, nos eventos mais glamurosos. A felicidade dorme num berço, pulsa num abraço, brinca num olhar encantado com as coisas belas da vida e se espalha nos sorrisos nossos de cada dia. A felicidade verdadeira só acontece quando nos encontramos com nossa essência e percebemos as maravilhas que a vida nos dá a partir do momento que nos doamos – como presente – para alguém!
Não adianta os shoppings começarem suas ornamentações em outubro! Não adianta os apelos para que compremos mais, tentando nos impor a verdade de que valemos pelo que temos... O Papai Noel com suas renas são doces fantasias que animam nossa infância, mas o Natal é mais que Papai Noel.
As filas de pais com seus filhos, esperando para sentá-los  no colo do “bom velhinho”, são enormes. Diante dos presépios, contudo, quase ninguém... É que, ao contrário do Papai Noel que nos leva ao mundo da fantasia, o Menino Jesus nos convida ao mundo real...
 Dezembro chega trazendo com ele um novo chamado para cada um de nós: deixemos o Amor habitar – de verdade – em nossos corações e transformar nossas vidas! Vamos lá, coragem !Arregacemos nossas mangas e comecemos nossa faxina interior. Joguemos fora tudo o que juntamos ao longo do ano: zangas, mágoas, a ansiedade para cumprirmos tudo o que nos obrigamos, a pressa que nos faz atropelar o presente, desencontros, tristezas e medos. Guardemos apenas o que nos fez crescer a partir de cada uma dessas experiências. Tiremos do baú cada momento especial que vivemos: cada alegria, cada abraço, momentos de perdão, descobertas e reencontros, toda beleza que a natureza nos oferta e que as pessoas nos presenteiam.
É tempo de Natal ! Para nós,cristãos, o aniversário do Menino Deus e a renovação de nosso compromisso de “amar como Ele amou e viver como Ele viveu”. Tempo de relembrar a certeza de um amor tão profundo e verdadeiro, que se fez criança e veio viver entre nós, conhecer nossas mazelas e nossos tesouros e nos redimir de nossos pecados. A chegada do Menino Jesus, nascido em uma família pobre, que nem encontra casa para pousar, é inquietante! E é essa inquietação  que precisa nos mover para que consigamos fazer valer o que Ele nos ensinou.
Independente da questão da fé, eu desejo profundamente que essa mensagem do Amor que integra e se entrega pulse em todos os corações. Cristãos, judeus, muçulmanos, budistas, candomblecistas, espíritas, messiânicos, umbandistas, ateus e pessoas de todas as crenças e não crenças, que o amor seja a mola propulsora de nossas vidas! Isso é o que importa ! É disso que precisamos e a isso somos chamados!
Vivemos um momento crítico. Bombardeados de notícias ruins vindas de todos os lados: atos terroristas, massacres, chacinas, assaltos e assassinatos, corrupção. Secas e enchentes. Doenças graves, hospitais superlotados, escolas vazias, ônibus queimados, tráfico de drogas e de pessoas.Terremotos, imigrantes sem oportunidades, racismo, preconceito, exclusão social. Sonhos roubados de crianças, adolescentes sem esperança, políticos olhando somente para seus umbigos, aposentados dormindo ao relento, sem teto e sem chão.  No meio de tudo isso, uma única notícia é capaz de nos fazer levantar a cabeça e seguir em frente: o Amor procura uma manjedoura para nascer e escolheu o nosso coração.
Deixar nascer o Amor em nós é fazer um pacto de esperança! Sabemos – por mais que o mundo diga o contrário – que não estamos sós. Aceitar o convite para natalizar vidas é, ao mesmo tempo, bênção e compromisso, alegria e inquietação pela dor do outro, esperança e disponibilidade para servir a quem prencisa de nós. Deixar nascer o Amor em nós é mudar o foco e olhar de coração para coração. É redescobrir o essencial e reencontrar certezas.
Que o Natal seja, para todos nós, tempo de beber da Certeza! Certeza de que viver vale a pena porque amar vale a vida!


Renata Villela  - Dezembro/ 2017

Para quem quiser escutar e contemplar essa mensagem, basta clicar aqui:

Video: Mensagem de Natal

domingo, 22 de outubro de 2017

Quem pegou a bússola?



Há tempos estou com vontade de escrever para partilhar meus sentimentos, meus questionamentos, minhas inseguranças e minha esperança. Às vezes me sinto como se estivesse naquelas piscinas de bolas que existem nos parques infantis, só que numa piscina funda e com o piso escorregadio. Cada dia jogam mais bolas e mais difícil se torna manter-me de pé e respirando. Outras vezes, me sinto no meio de uma multidão que, a cada hora, responde a determinado comando, mas está sem bússolas e, por isso, não sabe ao certo para onde está indo. O fato é que, a cada dia, somos surpreendidos por notícias que nos deixam indignados: são atentados terroristas, chacinas, políticos corruptos acobertados pelos que detêm o poder, jovens que matam jovens, enfim... E é assim que os meus sentimentos se encontram com os seus e quando olhamos em volta, estamos todos indignados, aturdidos, paralisados. E aí?

Tenho pensado no papel das escolas, das famílias, dos amigos, da vizinhança, da enxurrada de informações, da tecnologia, da espiritualidade (seja na vivência das religiões ou não) na formação de nossas crianças e de nossos jovens. Criamos esse emaranhado todo que é o século XXI e, agora, cabe a nós, desamarrar a realidade para ofertar a eles, um mundo – pelo menos – com esperança.

Não vou falar de cada um desses pontos que citei acima detalhadamente; quero expor as coisas que venho pensando, como sementes lançadas ao vento. Não tenho pretensão de trazer resoluções nem – muito menos – quero “colocar na roda” famílias e escolas. Espero apenas que as minhas palavras pousem em seus corações e façam brotar alguma nova reflexão. E que, da soma de nossas reflexões, geremos algum movimento novo.

Começando pelas escolas, incomoda-me profundamente ver que muitas instituições de ensino tornaram-se empresas, deixando para segundo plano, seu caráter educador. São empresas que oferecem conteúdos para que seus alunos (clientes) passem no vestibular. Importa satisfazer as expectativas dos clientes (pais e alunos), assim como fazem as concessionárias de veículos e as lojas de conveniências. Com isso, a educação se esvaziou.  O cuidado com o outro, o respeito aos professores, a ética e a cidadania, a transmissão dos valores essenciais à vida em comunidade perderam-se no meio das fórmulas de física, das listas de exercício de matemática e dos simulados periódicos.  Nesse contexto, cresce o desrespeito aos professores que não podem mais agir como educadores, já que o que se espera deles é apenas o fornecimento de informações. Nesse contexto, cresce o bullying, pois os alunos perderam a percepção da convivência com os diferentes e o movimento de criar vínculos verdadeiros com os colegas, a fim de fazer deles, amigos.

Das escolas para famílias, entramos num ambiente de carência e desencontros. A grande maioria dos pais está no mercado de trabalho, trabalhando cada vez mais para dar cada vez mais coisas a seus filhos. Não só produzem para saciar suas necessidades, mas criam necessidades para atender a ansiedade de preencher um vazio crescente, que não pode ser preenchido. Nessa roda-viva, no pouco tempo que resta para dar atenção aos filhos, fica difícil desagradá-los, dizer não, colocar limites. Mais do que os próprios filhos, os pais querem ser amados e é aí que começa a distorção de papeis e responsabilidades. Filhos não sabem mais qual o seu papel e ditam as regras. Pais não sabem mais seu papel e entram no jogo. As carências de um e outro criam uma distância entre quem realmente são e os papeis que desempenham. Assim, para os filhos, cada vez mais cursos e atividades; para os pais, cada vez mais cansaço e culpa. Para os dois, cada vez menos amor e verdade. Menos diálogo, parceria nas dificuldades e alegria verdadeira nas celebrações

Nossas crianças e nossos jovens vão crescendo assim e é assim que mergulham nos jogos eletrônicos e nas redes sociais, onde não precisam olhar nos olhos nem encarar conflitos. Tornam-se cada vez mais sós. Até aquela coisa da vizinhança amiga, onde o filho de um tomava café na casa do outro, se perdeu. Hoje, todos desconfiamos de todos e, na maioria das vezes, nem sabemos o nome do vizinho de porta.

Nossas crianças e jovens estão crescendo assim, enquanto nós – adultos – assistimos os noticiários que só falam de corrupção e violência e continuamos vivendo como se essas informações fizessem parte de uma realidade que não é a nossa. Nós, adultos, ficamos semanas e mais semanas comentando um atentado terrorista que matou 5 pessoas na Europa e nem prestamos atenção que, na Somália, outro atentado matou mais de 300... Mas onde é mesmo a Somália? Não interessa.... Ficamos arrasados com a notícia do adolescente que matou seus colegas numa escola particular em Goiânia, mas nem temos noção de quantos adolescentes têm morrido nas escolas da Rocinha e dos bairros de periferia de nosso país. É assim. Conscientemente ou não, a mensagem subliminar que passamos às nossas crianças e a nossos jovens é, no mínimo, esquisita, afinal, vida é vida, independente do lugar em que ela esteja. Estamos fechados em nossas conchas, atrás de tantas grades que vamos nos esquecendo das coisas que valem a pena na vida. Esquecemos de amar!

Está faltando amor no nosso mundo e em nossos corações, amor verdadeiro, aquele que nos faz  ser quem somos e acolher as diferenças dos que convivem conosco, sabendo que essas diferenças só nos farão crescer. Amor que nos inspira a cuidar e a respeitar o outro. Está faltando em nós, a experiência do amor, que é muito diferente das falas xamegosas de “eu te amo”. Está faltando em nós, ser presença uns para os outros, olhar para quem está de nosso lado, conhecer quem convive conosco.  Está faltando escolher uma escola para nossos filhos, pelos valores que a permeiam e não pelo número de aprovações no vestibular que ela apresenta nos outdoors. Está faltando em nossas famílias, sentar na mesa juntos na hora do almoço para repartir o frango, negociando quem vai comer as coxas, as asas e as partes que cada um gosta mais... Sair no domingo para andar de bicicleta... Sentar para estudar. Deitar na cama para contar como foi nosso dia e dividir nossos medos, mostrando que a vida não é um conto de fadas e que, nem sempre, conseguimos ter o que desejamos.

Quem pegou a bússola para nos mostrar o caminho que precisamos seguir? Vamos nos olhar, procurar em nossos bolsos e escutar nossos corações. Deixemos de lado o ímpeto de dividir as pessoas em vítimas e culpados, fracas e fortes, gordas e magras, pobres e ricas, certas e erradas e cuidemos melhor uns dos outros. Não esperemos novos atentados,  seja lá em que parte do mundo for. Não esperemos que mais um jovem atire em seus colegas ou se jogue do 30° andar do prédio onde mora. Vamos conversar mais, prestar mais atenção uns nos outros, ver além das aparências, sem julgar. Vamos transformar nossa indignação em inquietação e nossa inquietação em atitudes! Vamos?

Cá no fundo do meu coração, desconfio que cada um de nós tem uma bússola em sua mão. E ela aponta o caminho de um em direção ao outro. Vamos lá ! Tire sua bússola do bolso, vem pra cá, eu vou pra aí. Que nossas diferenças não criem paredes entre nós! Que nossas verdades não sejam absolutas, mas que tenham braços para abraçar a verdade do outro! Que tenhamos consciência de que todos precisamos uns dos outros! Que lembremos, dia a dia, que educar é dar limites e saber dizer não, assim como é valorizar os tesouros que cada um traz no coração.  Que procuremos compreender mais e julgar menos... E amar de verdade.

Escrevendo aqui, comecei a sentir meu coração pulsar de um jeito diferente... Sinto a esperança mostrar sua primeira folhinha, ao brotar. Começo a acreditar que somos capazes de sair da piscina de bolas e correr pelos jardins, sentindo a liberdade que nos foi dada de presente. Somos capazes, sim,  de nos afastar da multidão e pegar pela mão quem está perto de nós, pra brincar de roda, pra sentar no chão, pra olhar nos olhos e, juntando nossas bússolas e nossa vontade de ser feliz, fazer uma história diferente.

domingo, 24 de setembro de 2017

No que deu? Deu em vínculos de afeto que alimentam nossas vidas!

       



Estava na missa quando, na Comunhão, escutando a música "Chega Mais Perto", meu coração voou de volta à tarde de sábado.

"Essa amizade não tem barreira
não tem limite não
um vira três e três vezes nove
logo é uma multidão

Mundo pequeno pra tanto amor,
Pai, vê se aumenta esse mundo..."

Num evento até bem profano, a presença do sagrado estava nos vínculos que uniam os presentes e na reverência aos mestres e fundadores do colégio criado há 40 anos.

Estou falando aqui da festa "No que deu", que reuniu os ex-alunos do Colégio São Paulo (Salvador - Bahia). Como disse Lu, uma das organizadoras do encontro, "o mundo tá muito ruim, a gente precisa de eventos assim para se reabastecer, lembrando do que é realmente importante".

Importante, na vida, é alimentar amizades que superam distâncias, é resgatar o que foi constituinte de nossa história, é reconhecer a importância de quem participou ativamente de nossa educação, é recarregar as energias com o bem que nos habita, para recomeçar novos dias, novas etapas, com mais esperança.

Ontem experimentamos o importante em nossas vidas em cada abraço, em cada sorriso, em cada "você lembra de mim?. Ontem experimentamos o importante escutando Reverendo Enoch falar sobre Educação (com E maiúsculo mesmo),  abraçando ex-professores, relembrando histórias. Ontem, experimentamos o importante lembrando dos nomes de cada colega e do quanto eles foram importantes naquele momento de nossas vidas e muitos ainda o são, mesmo que haja mais de 30 anos desde o ultimo encontro.

Não vou multiplicar as palavras, mas quero eternizar esse momento em meu coração. Quero guardar a saudade dos amigos que já não vejo há muito tempo e também a emoção de cada abraço recebido.

Como é bom olhar pra trás e ver uma história construída a várias mãos! Como é bom olhar para frente e sentir que existe um futuro a ser escrito com base em cada aprendizado! Como é bom viver o presente e sentir o coração pulsar feliz!



terça-feira, 19 de setembro de 2017

Santa Teresa das mãos do artista




Como pode um artista, com suas mãos,
tornar verdade a profundidade do olhar de uma santa?

Como pode um artista, com sua inspiração,
traduzir a singeleza do sorriso de uma santa?

Como pode a arte
trazer a presença da verdade contida 
na vida de uma santa?

Como podem corações palpitarem assim tão forte
no encontro do concreto e do palpável
com a indizível experiência
que nasce do espírito?

Como pode uma riqueza, de valor inestimável,
estar esquecida, numa cidade escondida
no interior de um país tão pobre?

É Deus a nos surpreender sempre!
É a riqueza do ser humano a nos surpreender sempre!
É a oração que se traduz
na arte de quem se doa.

É a grata surpresa da simplicidade 
que abraça o divino
e faz nossa alma dançar
ao som da cantoria dos anjos no céu
a descortinar o véu
que esconde os tesouros mais valiosos.

São as maravilhas
que só os olhos que se elevam,
enxergam!
São as dádivas
que os os corações que procuram,
encontram.

(uma homenagem ao artista Veiga Valle)

domingo, 3 de setembro de 2017

O valor da vida


Ao longo da vida, a relação que temos com a morte vai mudando. A partir de um determinado momento, a notícia de que ela abraçou alguém vai se tornando bem mais frequente do que gostaríamos. Já não são os avós de nossos amigos que falecem, mas seus pais e os próprios amigos.
A forma como cada um lida com a morte é diferente, (afinal, somos diferentes!) varia de acordo com o contexto, a espiritualidade, a forma como encaramos esse tempo que passamos no planeta.  Algumas coisas, entretanto, sempre aparecem: a pergunta “e se?” é uma delas.  Isso porque, seja em que circunstância for, a morte sempre nos pega de surpresa.
 Apesar dessa introdução, não é sobre a morte que eu quero falar, mas sobre a vida! Trouxe a questão da morte porque, na idade madura, essa é uma experiência que nos chacoalha em relação à nossa própria vida e à vida dos que amamos. Dentre as tantas oportunidades de enxergarmos as possibilidades de viver a vida de forma mais verdadeira, a percepção da morte é uma das mais marcantes. A cada velório, a cada cremação ou sepultamento, ficamos  de frente com a nossa vulnerabilidade e efemeridade. Daí, duas perguntas passam a nos inquietar:
1.    O que temos feito de nossa vida?
2.    O que temos feito de nossas relações?
Pensando na primeira pergunta, viajo na questão do tempo. Como aproveitamos mal o tempo que temos! Quanto tempo perdemos em reclamações, lamentações, deixando passar batidos, momentos que não se repetirão, encontros que não voltarão.  Quantas vezes, em vez de “sacudir a poeira e dar a volta por cima”, ficamos amargando a rinite que a poeira nos traz! Quantas vezes, em vez de fazer das situações, aprendizado, ficamos remoendo mágoas e insatisfações... Quantas vezes, em vez de escrever de lápis, as tristezas e aborrecimentos, para que possamos apagá-los tão logo virem passado, riscamos e rabiscamos os incômodos de caneta e passamos a vida sem conseguir apagá-los, muitas vezes, culpando-nos pela forma como os escrevemos...
Complicamos muito o que poderia ser simples ! Colocamos foco no que não é importante e só percebemos o que era importante de verdade, depois que passa. Aí  ficamos repetindo os “e se?” sem encontrar respostas.  O bom é que a vida não desiste de nós e está sempre nos dando a oportunidade de recomeçar o novo capítulo de um jeito diferente.  Fico pensando que isso pode ser mais simples do que imaginamos, já que não precisamos deixar de ser quem somos. Ao contrário do que muitas vezes achamos, não precisamos mudar nosso jeito de ser nem de amar, talvez  precisemos só calibrar nossos pneus e andar na velocidade certa. Precisemos só limpar as lentes embaçadas para enxergar melhor quem caminha perto da gente. Precisemos nos aceitar, acolher nossas dificuldades e espinhos, sem renegá-los, mas compreendendo-os e trabalhando neles, sempre que possível...
Ainda sobre quem somos, penso que precisamos  amar quem somos. Deixar de lado o que a publicidade coloca como perfeição e o que as pessoas esperam de nós. Amar-nos como somos. Colocar nossos dons a serviço de quem precisa, sim, mas doar, também, um pouco do nosso tempo, para cuidar de nós mesmos. Nós também precisamos de nosso cuidado e de nosso carinho.... Às vezes, esquecemos disso! E vale lembrar que isso não é egoísmo, é amor também. Se Deus nos deu avida como bem mais precisoso, cuidar dela é ato de amor! Se a gente não se cuida, não se ama, cresce a amargura, o cansaço e aí, sim, o que poderia ser amor acaba se tornando egoísmo, pois passamos a colocar foco no nosso umbigo, nos nossos problemas, nas nossas dores, nos nossos medos, nas nossas dificuldades. Assim, deixamos de enxergar o outro!
Passando para a segunda pergunta, fico pensando que, se tivéssemos uma bola de cristal nas mãos a nos mostrar o último dia daqueles que amamos, agiríamos diferente. O “e se?” que surge nesse caso vem sempre cheio de culpas e cobranças e, muitas vezes, esquecemos que é no ordinário da vida que o amor se expressa da forma mais verdadeira. Ficamos achando que poderíamos ter sido mais presentes, ter dado mais carinho, enfim... Cobramos de nós, uma série de comportamentos e, na maioria das vezes, com lente de aumento. Que sempre podemos ser pessoas melhores, isso é fato, mas é fato também que o amor mais verdadeiro é, justamente, aquele que se expressa nas coisas mais simples. Enxergar o outro com os olhos do coração é tudo o que precisamos para cuidar melhor de nossas relações. Essa é a perspectiva do amor: o olhar, o cuidar, o ser...Na verdade do que somos e do que o outro é, nem mais, nem menos.
Na medida em que enxergamos as pessoas com quem convivemos como pessoas que não são extensões de nós mesmos, passamos a respeitá-las em sua individualidade e a ter relações verdadeiras. Relação entre dois sujeitos, duas pessoas.  Quando conseguimos nos relacionar assim, podemos ser nós mesmos, agir com espontaneidade, sem tentar ser o que o outro espera de nós. Encontro de afetos e de limites também! Penso que é importante  deixarmos de lado a expectativa de perfeição e colocar nossas fichas nas coisas que nos fazem viver a essência da vida! Aquelas coisas mais simples, um olhar, um sorriso, um copo de água, uma comidinha gostosa, um toque de carinho ou o compartilhar uma mensagem que achamos bonita... É dessas pequenas coisas que o amor vai se construindo.
Às vezes paro e vou passando um radar nas coisas do nosso cotidiano. Vejo o quanto nos perdemos em bobagens... Um se zanga porque o outro esqueceu o dia do aniversário, outro sai do grupo do wahtsapp por causa de discussão de futebol... É um que deixou com que uma atitude inesperada falasse mais alto do que toda uma história e outro que se magoou ao receber uma resposta que não gostou... Como somos bobos !!! Como nos perdemos facilmente do que é essencial. E as coisas do mundo parecem incentivar isso...Vamos ficando cada dia mais intolerantes e impacientes uns com os outros.
Aí, de repente, um infarto, um câncer, um acidente.... E.... Fica o quê?
Nesses dias, recebi pelo facebook uma pergunta que compartilhei e que ficou na minha cabeça e no meu coração por dias: “você é a saudade de quem?” Convido vocês a se perguntarem isso e a perguntarem também sobre quem é e quem poderá ser sua saudade.  Isso faz diferença!
Com essas respostas, faço o convite para que busquemos  reiniciar nossa trajetória com um novo olhar, na perspectiva de quem não quer passar por aqui em vão e de quem quer viver o presente como presente de Deus. O momento presente precisa ser, para nós, bem mais do que uma ponte entre o passado e o futuro, mas o instante em que experimentamos a vida com tudo o que ela tem a nos dar, curtindo a companhia de quem está ao nosso lado ( e a nossa própria companhia também!)
Tentemos descomplicar nossas relações, diminuir nossas culpas e nossas cobranças, pararmos por mais tempo para aproveitar o encantamento diante de uma flor, um passarinho, uma criança sorrindo, um casal se beijando...Coisas que acontecem todos os dias, todas as horas, mas que passam despercebidas por causa da nossa pressa e do foco que colocamos no que ainda virá.

Somos vulneráveis, efêmeros, finitos. Ao contrário do que pensamos, nosso “destino” não está em nossas mãos. Nelas, está a liberdade de vivermos cada minuto do jeito que escolhermosA felicidade não está do outro lado da ponte, não está na outra pessoa nem no pote de ouro, debaixo do arco-iris. A felicidade está no momento presente, quando o vivemos como experiência legítima do amor de Deus.
Qual o presente que vamos nos dar hoje?

quarta-feira, 2 de agosto de 2017

Vocação

Estamos condicionados a escutar a palavra "vocação" e associar a duas coisas: 
1. orientação vocacional, para escolha de profissão;
2. vocação religiosa.
Isso é um olhar reducionista e equivocado, por isso, é importante abrirmos essa escuta à possibilidade maior de significado dessa palavra. Vocação vem do latim "vocare" que significa "chamado". Quando trazemos o tema da vocação, estamos nos perguntando: "a que fomos chamados?". 

Pensar em vocação é pensar em nossa missão no mundo, é pensar nos dons que recebemos e como os colocaremos a serviço para fazer acontecer o Reino aqui.  Responder "sim" ao chamado que Jesus nos faz implica comprometimento com o "para quê" estamos vivos.

Assim, nosso primeiro chamado é à vida. Esse é nosso primeiro "sim", quando choramos e abrimos os pulmões para respirar fora do ventre materno. Vale lembrar, contudo, que é importante renovar esse sim periodicamente, para que não caiamos na cilada de sobreviver aos tropeços, esquecendo do que é essencial. Diariamente, em nossos momentos de oração, na revisão de vida, podemos nos perguntar: "estamos, de fato,  vivendo?"

Depois desse, vêm os outros chamados: à família, à vida religiosa, à atuação leiga, enfim, o chamado de ser quem somos, colocando nossos dons a serviço do bem comum, exercitando nossos dons e nos posicionando no mundo como seres singulares.. A escolha da carreira pode ou não ser um braço direto dessa vocação, porque a resposta à nossa vocação é mais que profissão, é serviço! Alguns de nós têm a possibilidade de conciliar a atividade que traz o sustento com o exercício de se colocar em doação ao outro, Já para outras pessoas, essa "cola" não é tão direta. O exercício da profissão está ligada à realização de um trabalho que gera renda e a resposta à vocação está em outro lugar, num serviço voluntário, numa pastoral da igreja, na atuação familiar... Seja de que forma for, a vocação está relacionada ao nosso lugar no mundo, à nossa realização como PESSOA e, consequentemente, à nossa felicidade, em seu sentido mais profundo.

Quando entendemos os sinais e discernimos sobre o que Deus espera de nós, descobrimos a felicidade de compor a grande orquestra dos que disseram sim ao Amor (maiúsculo), na experiência do Evangelho. Entendemos o que significa "dar de graça o que de graça recebemos". Encontramos nossa razão de ser e o sentido de nossa existência. 

Quando silenciamos nossos ruídos internos para escutar o chamado que Jesus nos faz (e Ele nos fala no silêncio da oração e, também, pelas palavras espalhadas no mundo) largamos o que nos prende e O seguimos, movidos por uma chama que não se traduz nas coisas do mundo. Nessa perspectiva, todo esforço se torna pequeno diante da consolação que brota em nossos corações. A questão é que Ele fala baixinho e nos convida a ler as entrelinhas dos acontecimentos. Se levamos nossa vida na correria e ficamos só na superfície das oportunidades que a vida nos dá, corremos o risco de passar em vão pelos anos de nossa existência, prolongando um vazio que se arrastará e nos sufocará. Se nos dispusermos a desacelerar, a abrir nossos ouvidos para "a voz que nos chama", perceberemos como é simples (ainda que nem sempre seja fácil) encontrar a consolação do encontro que nos faz um com Deus.

O mês de agosto é o mês dedicado às Vocações. Que tal pararmos um tempo a cada dia para refletir sobre nossas respostas e, sempre que for preciso, ajustar as velas de nossos barcos para navegarmos aonde precisamos ir?

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Arthur, guerreiro da paz !

Foto retirada do site G1 - Globo

Quando vi, no jornal,  o caso da mãe grávida, atingida por uma bala perdida no Rio de Janeiro, fiquei estarrecida. Mais ainda, ao saber que o bebê havia sido atingido...

As primeiras notícias davam conta da baixíssima probabilidade de sobrevivência do bebê, que teve os pulmões perfurados e a bala alojada na coluna. Fiquei com o coração apertado. Os dias se passaram e, volta e meia, eu me lembrava do bebê, até que, nessa semana, vi uma nova reportagem informando que o caso era grave, mas estável e o pequeno Arthur permanecia lutando pela vida!

Já já vai fazer um mês que Arthur veio ao mundo! Apesar da recepção tão violenta, ele não desistiu! É lutador! Está aqui para nos mostrar o valor da vida, a importância do amor e que a dedicação dos que cuidam dribla o impossível.
Não dá para imaginar o que está acontecendo no coração dessa mãe e dos demais familiares. Indignação, tristeza, um misto de sentimentos a tomar conta de quem se vê diante do inesperado. Por outro lado, ao mesmo tempo, esperança! Se os primeiros dias trouxeram um profundo sentimento de desolação, cada dia deve estar alimentando os corações dessa família: uma vitória a cada dia, um milagre que se renova.

Fico pensando também no que se passa no coração de cada um dos membros da equipe de saúde que está cuidando dele: o empenho para colocar em prática todo conhecimento adquirido ao longo dos anos, a vibração a cada pequena vitória, o exercício de encarar cada dificuldade em desafio e cada desafio vencido em esperança.

Diante da gravidade não só do quadro do pequeno Arthur, mas do fato em si, um desejo que trago em meu coração é de que não passemos imunes a tudo isso. Arthur não pode e não deve se tornar apenas mais uma notícia na imprensa nem mais um dado nas estatísticas de violência de nosso país. Arthur precisa ser, para todos nós, um mensageiro das coisas que precisamos ver, ouvir e fazer ! Um despertador vivo a nos dizer: acorda, povo!

O nome da favela: Lixão. Será esse um nome para o lugar onde pessoas moram, transitam e vivem? Foi lá, na favela do Lixão, mais uma entre tantas comunidades pobres de nosso país, que uma bala perdida fez uma história diferente. Dessa vez, não foi um jovem da comunidade nem um engenheiro da zona sul... Dessa vez não foi o menino que jogava bola nem a senhora sentada na varanda: foi um bebê, no ventre de sua mãe!  E nós? Continuamos a agir da mesma forma... Continuamos a nos assustar diante das manchetes das más notícias e a nos acomodar durante o dia a dia. Continuamos a sobrecarregar as redes sociais com comentários de indignação nos primeiros dias da ocorrência do fato e, logo depois,  descartamos esses acontecimentos, para não sofrermos pelo que não conseguimos resolver. O fato é que, ainda que nos acomodemos e nos acostumemos ao sangue que escorre dos telejornais, num leito de UTI neonatal de um hospital público, um coração continua a bater e, em cada pulsação, lembra-nos o valor da vida.


Aproveito esse fato esdrúxulo para deixar meu apelo: não deixemos que a luta do pequeno Arthur seja em vão! Comecemos a nos movimentar, a mudar nosso jeito de agir, a relembrar o valor da vida através de cada uma de nossas atitudes. 

O mundo parece perdido. Os problemas de nosso país parecem não ter solução. É no meio desse contexto conturbado, que o pequeno Arthur nos mostra que o improvável, quando abraçado pelo amor, ganha forças inacreditáveis.  E se não temos condição de prever o futuro, temos a responsabilidade de viver o presente com toda força do que acreditamos, transformando-o a nosso favor. Aliás, mais do que a “nosso” favor, a favor de todos.

terça-feira, 25 de julho de 2017

Vida, dom de amor






Olhar radiante,
Coração pulsante,
Perto ou distante,
Brilho, diamante.
Vida, dom de amor.

Sorriso, ternura,
Alegria pura,
É amor que cura,
Luz em noite escura.
Vida, dom de amor.

Palavras, sementes,
Rio, água corrente,
Som que a gente sente,
Luz de sol poente.
Vida, dom de amor.

Força, mão na mão,
Marcas, construção,
Sim à vocação,
Serviço, missão.
Vida, dom de amor.

Bem aventuranças,
coração criança,
fé e confiança,
pés na temperança.
Vida, dom de amor.




segunda-feira, 1 de maio de 2017

Trabalho é dignidade


“Sem o seu trabalho, o homem não tem honra"
                                                           Gonzaguinha

Eu tinha vinte e poucos anos, trabalhava em Recursos Humanos, na Rede Meridien, e uma das minhas principais atividades era recrutar e selecionar pessoas. Recebia as vagas com seus respectivos requisitos, analisava os currículos do cadastro e convocava as pessoas para testes e entrevistas. Em seguida, encaminhava os que mais se enquadravam no perfil solicitado para a liderança requisitante. Se, por um lado, esse é um trabalho muito interessante, (porque nos permite conhecer muita gente e sentir a felicidade quando o “sim” é dado a algum profissional), por outro lado, é doído, doloroso, porque o número de vagas disponíveis nunca é igual à quantidade de profissionais competentes em busca de emprego.
Estava acostumada às longas filas e sempre tive o cuidado de, independente do cansaço de horas a fio analisando currículos e entrevistando pessoas, tratar todos com o mesmo respeito e a atenção. Sei que em muitos lugares os desempregados são tratados como números, mas nós (eu e minha equipe) sempre procurávamos enxergar “a” pessoa, inclusive, tentando quebrar o estresse daquele momento difícil. Muita gente passou por mim; foram muitos anos nesse trabalho. Foi ali que uma mulher marcou minha história profissional.
Fazíamos uma seleção para “Caixa de Restaurante”. Os candidatos faziam alguns testes de competência técnica, participavam de dinâmica de grupo e, depois, das entrevistas.A mulher não era candidata. Bateu na porta de minha sala e pediu licença. Chamei-a para entrar e sentar-se. Ela disse que não tomaria muito o meu tempo, queria apenas me dizer uma coisa. Foi aí que, olhando nos meus olhos, ela falou:
“Um homem se humilha se castram seus sonhos,
Seu sonho é sua vida e vida é trabalho
E sem o seu trabalho,
Um homem não não tem honra
E sem a sua honra, se fere, se mata”     

Depois contou-me que o marido estava desempregado há mais de um ano e estava a beira de uma depressão.Pediu-me que não deixasse – sob nenhuma hipótese – que ele soubesse que ela esteve ali comigo, mas que desse a ele, uma oportunidade. Expliquei a ela como se dava um processo seletivo e prometi que, se ele fosse bem no processo, seria encaminhado para a liderança escolher. Era o máximo que eu podia fazer. Aliás, era o que eu faria, com ou sem a intervenção dela. O fato é que aquele encontro, naquele dia, ressignificou o meu trabalho e a perspectiva que passei a dar ao trabalho de cada um. Eu era jovem demais para entender um monte de coisas, mas naquele instante, eu entendi que o trabalho é muito mais do que uma forma digna de ganhar dinheiro. É um alicerce da dignidade humana. O rapaz –por mérito próprio – conseguiu a vaga de emprego. Depois foi até promovido. Eu saí do Meridien e ele ainda trabalhava lá.

Anos mais tarde, fui eu que vivi a experiência do desemprego, a dor de querer trabalhar e não ter oportunidade no mercado. Senti na pele o quanto a falta de trabalho mexe com a autoestima, o senso de pertença e o próprio sentido da vida. Tive a sorte de ter amigos e família que me apoiaram e a coragem de recomeçar do zero.
Há pouco tempo, tive uma das mais tristes experiências de minha vida profissional: ser obrigada a dispensar profissionais extremamente competentes, por definição da companhia, que terminou com todos os contratos. Ver essas pessoas, competentes, comprometidas, éticas e criativas serem disponibilizadas ao mercado de trabalho, num momento em que o país está com um número crescente de desempregados, doeu demais. Sei bem que ficar sem trabalho é muito mais do que ficar sem um ganha-pão. A sensação de impotência foi enorme e não tem um dia que eu não peça a Deus para que novas portas se abram para essas e para todas as pessoas que estão nessa situação tão crítica em nosso país.
Nesse fim de semana, peguei o uber três vezes e, por coincidência, os motoristas foram três pessoas com mais de cinquenta anos, todos sem oportunidade no mercado de trabalho: um consultor de sistemas da informação, um adminstrador de empresas e um contador. Três motoristas! E, ainda que seja esse um tema bastante controverso, bendita uber que está devolvendo a dignidade a pessoas cheias de gás para produzir e servir à sociedade.
Hoje, dia do Trabalho, todas essas lembranças e reflexões vêm a minha mente e coração. Não posso deixar de agradecer a Deus pela oportunidade de trabalhar não apenas para ganhar meu salário no final do mês, mas para fazer valer minha missão nesse mundo. Sei que – infelizmente – faço parte de uma minoria. Aproveito também esta data para dizer muito obrigado a todos os profissionais que cruzaram o meu caminho e que tanto me ensinaram com seu conhecimento, sua competencia, seu comprometimento e sua postura ética.
Estamos beirando uma reforma trabalhista. No meio das interrogações, ficam apelos: que o significado do trabalho não se perca nos números; que as relações de parceria que geram os melhores resultados não se percam no embate patrão X empregado. Sobretudo, que o trabalho seja o principal gerador de renda em nosso país, para que todos tenham seus direitos preservados, seus ganhos garantidos e suas vidas vividas com justiça e dignidade.
Que esse dia, mais do que de festas, seja de conscientização. Independente de profissão, que todos os trabalhadores recebam nosso muito obrigado por sua dedicação e serviço prestado à sociedade. Que recebam salários justos e que tenham as condições necessárias para cumprir suas atividades laborais.
Aos garis, professores, empregadas domésticas, médicos, engenheiros, porteiros, pintores, manicures, psicólogos, pedagogos, arquitetos, cozinheiros, garçons,motoristas, artistas, administradores, atendentes, padeiros, farmacêuticos, nuticionistas, assistentes sociais, analistas, ambulantes, marceneiros, pescadores, enfermeiros, vendedores, a todos, indiscrimidamente, meu muito obrigado!E minha reverência!
Aos desempregados, meu desejo verdadeiro de que não percam a fé nem a coragem. Façam o que for possível e preciso para que sejam o melhor que puderem ser. Busquem alternativas e foquem no que desejam. Acreditem: tudo passa! E manhãs ensolaradas são mais bonitas depois de noites chuvosas. Creiamos nas novas manhãs!



domingo, 30 de abril de 2017

Meu coração chora a violência



Meu coração, hoje, chora
as escaras abertas
por tanto ódio escorrido
pelas redes sociais.

Meu coração chora
os cortes, os rachas,
o movimento cruel que nos separa
e menospreza o lado oposto,
em vez de integrar-nos
como faces de um mesmo rosto.

Meu coração chora
nossa incapacidade de aceirar
o diferente;
nosso desejo de enquadrar
toda gente
num mesmo jeito de pensar,
sob o jugo da burrice sórdida,
colada como rótulo
na testa dos que escapolem do quadrado imposto.

Meu coração chora
por esse presente míope,
o olhar desfocado,
nosso passado rasgado
e o futuro obscuro
a nos esperar.

Choro por ver, hoje, explícito,
vindo de todo lugar,
o desejo de distribuir violência
brotado na impaciência
que faz sangrar.

Meu coração chora
não pelas divergências
- elas sempre são saudáveis;
não pelas diferenças
- elas sempre são complementares...
Choro pelas guerras que travamos,
uns contra os outros,
massacrando a liberdade
e exacerbando nossa necessidade
de fazer valer nossa verdade pessoal,
assassinando tudo o que não é igual.

Choro a dor da desesperança
no ser humano que se engasga
com suas próprias palavras.
Perdeu-se da criança que brincava em times opostos
que , depois, se misturavam...
Sabia colocar tudo em seu devido lugar!

Choro
porque meu sonho de viver
num país diverso e forte
escorre, verso a verso,
na frustração das algemas
que nos colocamos –mutuamente –
ao trocarmos farpas,
ao incentivarmos tapas,
ao nos perdermos em cisões
que só nos afastam
do bem comum.

O diálogo saiu de moda
e  o óbvio tornou-se unilateral.
A ânsia de apontarmos
o mal que há no outro
só faz aumentar a rede de esgoto
que deixará submersos,
impiedosamente,
todos os nossos ideais.

Choro, mas lá no fundo, ainda acredito
que ainda há tempo
de somar nossos anseios
e colocar um freio
no trator que vem derrubando
nossas construções.

Quero afastar a angústia
que, hoje, me aperta o peito
e voltar a acreditar
que há um jeito
de, respeitando nossas diferenças,
percebermos que conflitos só nos fazem crescer
quando não se encerram em si.

Não sei quando poderei sorrir...
Hoje, vejo muros mais altos que pontes
e fico tonta
diante de tanta agressividade.
Espero que, no futuro,
a história conte esse nosso tempo,
como tempo de transformação,
de superação das algemas e tornezeleiras
para a celebração do  encontro de tantas bandeiras
que, juntas, depois de muito trabalho,
encontraram novas soluções.

Choro, sim,
mas não paro de sonhar.
Os sonhos me mantêm viva
e avivam, em mim, a certeza
de que é necessário dormir
para acordar

num amanhã melhor.

sexta-feira, 14 de abril de 2017

Dia santo,de amor e perdão


Lá fora, chove forte...E a imagem que me vem é a do choro de toda humanidade se derramando sobre nós... O choro de mães que perdem seus filhos nas guerras, no tráfico, no trânsito...O choro das pessoas desempregadas, que sofrem pela insegurança e pelas dificuldades que se repetem... O choro das pessoas doentes, no leito dos hospitais, com suas dores físicas e emocionais... São tantos choros acumulados que, diante da Sua cruz, Jesus, transbordam.
A sexta-feira santa é um dia triste... Não só porque Você morreu há tantos anos,mas também porque Você continua sendo crucificado diariamente....Porque continuamos sem entender (mais ainda, sem viver) Suas palavras. Seguimos cegos para a Verdade Maior.

Seu Amor é tão grande que não cabe em nossa lógica... Volta e meia, em nossas reflexões, teimamos em não perceber o seu SIM. Ficamos indignados diante da maldade humana, mas passamos batido pelo fato de que Você tomou a cruz para si, por Amor. Poderia tê-la negado e pensado em si, mas não ! É difícil pra gente entender um amor que escolhe sofrer por nós, que não usa seu poder em benefício próprio...  Seu Amor foge do esperado e nos surpreende... Seu Amor me instiga, Jesus, me inquieta.

Olhar Seu rosto sangrando, imaginar a dor de estar pregado numa cruz, sendo puxado para a terra pela lei da gravidade, imaginar o sofrimento de não ver Seus discípulos ao Seu lado, tanto escárnio e zombaria...Tudo isso me dói tanto. E dói ainda mais quando penso que mudamos tão pouco. Somos ainda o povo que quer soluções imediatas, que não dá a outra face, que bate as portas das hospedarias e que foge ou nega, na hora que a coisa aperta. Somos ainda o povo que só enxerga a sua própria verdade, que é intolerante com os diferentes e que quer dar as cartas do jogo. Se for diferente do script que escrevemos, não vale.

Diante de Sua cruz, Jesus, só uma palavra brota em meu coração: perdão!  Perdão não apenas pelo que fazemos de errado, mas por todas as vezes que deixamos de fazer o certo. Perdão não só pelo lado mal que mora em nossos corações, mas pelo bem que não exercitamos nas pequenas coisas. Perdão, Jesus, pela cruz que colocamos nas Suas costas, cada vez que nos calamos diante das injustiças, que nos acomodamos diante das coisas do mundo e que nos esquecemos de Sua Palavra e de Seu exemplo de Amor.


Perdão, Jesus! Ajuda-me a ser uma pessoa melhor. Ajuda-nos a ser uma sociedade melhor!

                                                       Renata Villela, 15/04/2017

sábado, 8 de abril de 2017

Bem-vinda, Alice

Alice

Nasceu Alice:
a mais nova princesa do Reino Encantado;
é a vida que chega, nos dando um recado:
criança é esperança
no tempo do Amor.

Bem-vinda, Alice!
Seu choro chegando faz chorar também,
é tanta alegria, que a gente não detém,
transborda em gotas
que fazem sorrir.

 Alice,
menina táo linda e tão esperada,
florzinha cheirosa e já tão amada,
sua vida renova nossa caminhada,
empolga a seguir semeando o que virá.

Vem, menina,
anima essa gente, reensina a sonhar,
convida a gente a buscar o lugar
das mil maravilhas que encantam a vida.

Alice, menina querida, nossa princesinha,
primeira  semente de uma geração,
vem jogar na gente, nova sementinha,
pra fazer florir nosso coração.


                                                                Em 08/04/2017

domingo, 2 de abril de 2017

Viver o presente



Ontem eu estava arrumando uns arquivos no computador e comecei a olhar algumas fotos que me fizeram viajar no tempo. Ao contemplá-las, pensei: “como estávamos felizes! Nem imaginávamos que pouco tempo depois, o que construímos ficaria vivo apenas nas nossas lembranças, nosso grupo se desfaria e encararíamos uma situação tão adversa.” Através daquelas fotos, revivi toda alegria e senti os sorrisos me contagiarem. As lembranças me despertaram a pensar no presente, como um milagre que não se repete.
Quantas vezes deixamos o agora passar porque estamos envoltos nas preocupações do que virá ou na saudade do que se foi? Quantas vezes atropelamos as pequenas coisas, dando valor ao que nem é importante para a vida, ainda que o seja para a sobrevivência? A gente chega nos lugares sem nem lembrar qual foi o caminho que fizemos; termina de almoçar sem nem ter degustado o sabor do que comeu...  A gente senta do lado de alguém, mas abaixa a cabeça para acompanhar o whats app que não para de notificar postagens. Aí, de repente, leva uma rasteira da vida. De cara pro chão, vê amigos com doenças graves, vê pessoas sofrendo o luto de alguém e se dá conta do quanto somos vulneráveis. Tudo passa. Tudo, um dia, se acaba. Se não tivermos visto as sementes brotarem, as flores desabrocharem, o inverno chegará, secará tudo e só ficará o aperto no peito. Precisamos atentar para o aqui e o agora e perceber que o nome “presente” não é por acaso. Aliás, nada é por acaso.
Fico pensando que, talvez, mais do que esperança, precisamos da experiência da vida diária, porque é nela que recarregamos as energias para encarar as turbulências. Porque turbulências sempre virão, o sofrimento é inerente à vida, não depende de nós. O que depende de nós são os laços que criamos, as alegrias que alimentamos, a fé que cultivamos, os sorrisos que despertamos, os sonhos que sonhamos, ainda que, nem sempre, sejamos capazes de realizá-los. É o presente que recebemos a cada segundo que nos mantém vivos, independente do que passou e do que virá.
Estamos vivendo um tempo de desesperança em nosso país e isso contamina, como doença que vai corroendo o brilho de nosso olhar. Vivemos, ao mesmo tempo, o saudosismo de uma época (que nem sabemos – ao certo – se, de fato, vivemos) e a pressa de fazer os ponteiros rodarem mais rapidamente, na expectativa de tempos melhores. Fica uma nostalgia que nos cega para o que não está no mural. Abatidos, seguimos tropeçando nos acontecimentos e não sugamos deles, o nectar da vida. Precisamos encontrar luz no que tem luz de verdade e a única luz que é infinita e eterna é a luz do amor. É bem verdade que amar dói. E como dói! O amor, ao mesmo tempo que nos faz tocar o céu – na dimensão do que está além das coisas desse mundo caótico – nos põe de frente com a consciência de que temos um “prazo de validade” e não somos super heróis. Ao tempo que desejamos fazer tudo por quem amamos, nos damos conta de que, muitas vezes, tudo o que podemos fazer é rezar, ser presença...E amar!  Mas é o amor, o gancho que nos prende – como âncora – ao presente, fazendo-nos viver cada dia. O amor nos faz parar no encontro de olhares, no encanto de sorrisos e na presença contida em cada lágrima derramada, seja por que motivo for, mas que sempre nos lembra nossa humanidade.
A verdade é que, entre sorrisos e lágrimas, encontros e desencontros, constatamos que nada na vida se repete. Por isso, se não vivemos aquele instante, perdemos. O presente, quando vivido intensamente, ao passar, deixa marcas que não passam. Ainda que o tempo passe, o presente se eterniza no além tempo. Por outro lado, se o presente passa, por nós,  despercebido, vira passado. Amassado como papel velho, com cheiro de mofo. E o que passou sem amor, passou...
O tempo não depende de nós. Experimentá-lo, sim.  Que o agora seja, para nós, presente e que o presente, seja para nós, certeza de que estamos vivos para viver.

Renata Villela – Abril/2017