sábado, 31 de julho de 2021

Sobre vencer e ser - Reflexões sobre as Olimpíadas de Tóquio

 



Esse texto não é sobre ser vencedor ou ser perdedor, é sobre reconhecer que, na vida, ganhamos e perdemos e precisamos acolher os dois lados da moeda com o máximo de serenidade possível e com a consciência de que viver é arriscar-se continuamente. Esse texto também não é sobre pessoas que se superam e aquelas que “amarelam”(que termo horrível!), mas é sobre a importância do autoconhecimento e o dar-se conta de quais limites são possíveis de ser superados no momento presente e quais nos dão a chance de revermos nossas estratégias.... Lembrando sempre que nenhum de nós, nem os grandes campeões olímpicos, é super-herói. Todos somos feitos de carne, osso e emoções.  Esse texto é sobre a experiência de pessoas que vivem e, com suas vidas, ensinam o que é – de verdade – vencer.

Desde pequena, sempre gostei das Olimpíadas e das Paraolimpíadas, por serem eventos mundiais, inclusivos, que prezam pela integração dos povos e pelo amor ao esporte. Com o passar dos anos, assisti-las foi se tornando bem mais do que estar diante de eventos especialíssimos, mas de um livro aberto com infinitos aprendizados. Muitas pessoas marcaram a história das Olimpíadas.... Lembro da Nadia Comaneci, da ginástica artística, surpreendendo o mundo por ser, ao mesmo tempo, tão jovem e tão técnica. E o que dizer da maratonista suíça Gabriela Andersen, que chegou cambaleando, sugando suas últimas forças para dar conta de atingir seu objetivo. Lembro também do Vanderlei Cordeiro, maratonista brasileiro, desviado de seu caminho por alguém que não o impediu de chegar onde queria. Falando dessas tantas lembranças, entre as mais recentes, Daiane dos Santos,  com toda sua representatividade, raça, fibra e brasilidade e Bernardinho, emoção que saía pelos poros e contagiava. Tantas histórias que deixaram suas marcas para sempre, não somente para as Olimpíadas mas também para nossas vidas! Quem teve olhos para ver, viu e aprendeu com cada um deles. Não necessariamente nos ensinaram mais quando (e se)  receberam medalhas de ouro, mas – sobretudo – quando trouxeram suas humanidades ao “mundo do Olimpo”.

As Olimpíadas desse ano traz, em si, a marca de muitas dores, perdas e superações. A abertura já foi um chamado a nos repensarmos como humanidade. Começando as provas, fico pensando que, apesar da cobrança de muitos torcedores e comentaristas, cada um que está ali para competir no seu esporte e defender o seu país, já começa com medalha de diamante, por ter sobrevivido a todas as dificuldades desses últimos anos, por ter conseguido fazer seu desejo pulsar mais forte que as frustrações. E cada um deles sabe a que custo! Nós, brasileiros, sempre queremos muito e esquecemos de olhar o contexto das coisas... Quantos desses atletas tiveram o patrocínio necessário, fizeram os treinos adequados para chegar lá? E mesmo aqueles que têm ótimos patrocínios e conseguiram se adequar à nova realidade, mantendo treinos eficazes, quanto precisaram desafiar-se diariamente, vencendo seus inimigos internos, os gritos de seu corpo, suas dores diversas? Olhar para cada um deles competindo me traz a sensação de assistir vários filmes, imaginando a história de cada um.

Ainda temos muitas competições para acontecer, mas algumas lições já ficam. Por coincidência (ou não!) os registros mais fortes das Olimpíadas de Tóquio até aqui, para mim, foram de mulheres. Assim, eu quero expressar o que estou aprendendo com cada uma delas. Vou começar pela ginástica artística, destacando, por um lado, a Rebeca e, por outro, a Simone Biles. A Rebeca, ensinando a determinação, a autoconfiança, a superação após lesões e cirurgias e a presença firme de sua mãe. Uma menina de vinte e poucos anos que nos deixa boquiabertos por sua competência e entrega. Tudo isso, com uma simplicidade linda de ver. A Simone, por sua vez, com a coragem que só os grandes têm, abrindo mão das medalhas em prol do que é essencial e dando voz, não só a muitos atletas, mas a tantas pessoas que sofrem caladas com problemas de saúde mental, sem conseguir expressar sua dor, porque a sociedade julga os transtornos mentais como fraqueza. E, para uma sociedade que exalta a felicidade e as conquistas, a Simone mostrou que é uma pessoa especial, de uma força que, talvez, nem ela, nesse momento, seja capaz de perceber. Sua fragilidade tornou-se sua força.

Da ginástica artística, vamos ao futebol feminino. Dois ícones da nossa seleção ensinando o que é saber perder, assumindo a dor, a tristeza, a frustração, mas exercitando o companheirismo, o senso coletivo e importância de reconhecer tudo o que foi feito de bom, aprendendo com os erros, sem crucificar ninguém por eles. Formiga e Marta mostraram o que as faz referência no esporte, independente de “voltar para casa” sem medalhas. Formiga, abrindo mão de uma decisão pessoal pelo coletivo e mostrando como é bonita a relação entre as gerações, sem superioridade, pelo contrário, colocando-se a serviço! Marta, que liderança! Marta vem mostrar, com suas atitudes, dentro e fora de campo, porque é tão respeitada. Que bonito ver sua alegria, fazendo-se menina entre as meninas, transformando o peso da responsabilidade na leveza de uma experiência que, independente dos resultados, sempre deixa aprendizados enormes. E para coroar tudo o que ela é, duas atitudes me chamaram muito a atenção no último jogo: a obediência à orientação da técnica, mesmo consciente do desgaste físico que isso representava e a inteireza de sua declaração no final do jogo, pedindo que não criticassem as jovens, que se fosse para falar mal, falasse dela. Só grande líderes, grandes seres humanos são capazes de atitudes assim. “Pegando o gancho” das palavras da Marta em prol da juventude, que coisa linda ver Rayssa Leal fazendo história no skate, no esporte, no Brasil! Uma fadinha do Nordeste brasileiro inundando nossos corações de esperança, a esperança que brota de atitudes responsáveis e comprometidas, mesmo estando ainda auge de sua adolescência. Um grande exemplo para nós, adultos.

E é assim, com esses exemplos, que eu termino essas reflexões de hoje, certa de que muitas outras pessoas deixaram e ainda vão deixar suas marcas nesse capítulo da história. Que a garra, as palavras, o silêncio, a determinação, a resignação, a coragem de “ser quem são” de cada uma dessas mulheres, nos inspire a ser pessoas melhores, Que acreditemos – de dentro para fora – que podemos e devemos sonhar e batalhar para que nossos sonhos se tornem realidade, mas que estejamos sempre atentos aos sinais que a  vida nos mostra, para que saibamos a hora de avançar e o momento certo de recuar, respirar para, depois, retomar a caminhada. Que ousemos sempre vencer barreiras, sem nos esquecer que limites existem, sim, e precisam ser respeitados. Que, a cada manhã, lembremo-nos que viver é arriscar-se e que, muitas vezes, ganhar ou perder não está em nossas mãos. Que entendamos que precisamos, sim, sempre nos esforçar para sermos o melhor que podemos ser, acima de tudo como pessoas. E, conscientes de que não temos controle de nada, nem de nossos próprios corpos e mentes, por mais que possamos estar treinados para isso, recebamos a nossa humanidade com carinho, acolhamos nossas dores, nossos limites, nossas fragilidades, certos de que, mesmo os campeões são humanos como nós. Que não percamos a oportunidade de celebrar alegrias, vitórias, encontros, porque momentos não se repetem. E que possamos, todos juntos, cada um de seu lugar na história da humanidade, aprender com os exemplos uns dos outros, para que – um dia – consigamos ser uma sociedade que se supera, que surpreende, que bate recordes positivos e que faz da vida saudável no planeta, sua medalha mais importante.

Obs: Fotos tiradas da internet

sábado, 24 de julho de 2021

Sobre avós e netos

 


Há muitos anos  (eu nem sonhava em ser avó ) eu estava num supermercado e fiquei  observando o que acontecia do meu lado. Um menino - com cerca de 6 anos -  e uma senhora, os dois em pé, de frente para a prateleira de bolos. O menino estendeu a mãozinha e pegou um bolo de cenoura. A senhora, inconformada, perguntou:

- Você gosta desse bolo?

Ao ouvir a resposta positiva, ao contrário do que imaginei, pegou o bolo na mão da criança, devolveu-o à prateleira e pegou outro, também de cenoura, só que com cobertura de chocolate. Com um sorriso largo, daqueles que vão de uma orelha a outra, exclamou:

- Você vai gostar mais desse. É muito mais gostoso !!!!!

Eu, de meu canto, dei risada comigo mesma e pensei: “só pode ser avó”.

 

***

Existe uma coisa meio mágica em ser avó... Parece que os netos despertam a criança adormecida ao longo dos anos, em que as preocupações e responsabilidades tomam o espaço das molecagens e brincadeiras. Avós podem deixar – com pré autorização divina – comer biscoitos antes do almoço, brincar com coisas que não são brinquedos, dormir de pés sujos e raspar a panela de brigadeiros. Quando avós e netos se encontram, parece que a vida cumpre seu ciclo de integração e continuidade. Eles aprendem juntos e descobrem coisas que nenhuma outra relação é capaz de descobrir: sentimentos e experiências que não tem nome. Tudo sempre recheado de ternura e alegria.

Convivi muito pouco com meus avós porque, desde muito pequena, vim morar em outa cidade. Minhas duas avós tinham apelidos: vovó Ia e vovó Zozô... Precisa dizer mais alguma coisa? Quer coisa mais gostosa do que avós que têm apelidos? Pois bem, de vovó Ia, eu lembro muito da gargalhada e do pudim com furinhos. De vovó Zozô, a lembrança já é de adulta, quando ela veio conhecer minha filha e eu a surpreendi dando sorvete a ela que, nessa época, tinha apenas três meses de idade. Não! Avós não são irresponsáveis, simplesmente aprenderam que, na vida, o que tem valor são os momentos que vivemos com quem amamos, fazendo as coisas que nos fazem rir. E se não fizer mal pra ninguém, vale a curtição de quebrar as regras e ser feliz! Por que não?

Avós também educam...E também choram. Avós têm vontade de poupar filhos e netos de todo e qualquer sofrimento, sendo capaz de dar a vida por eles. E, de uma forma ou de outra, dão. Avós estão sempre a postos para ajudar, ainda que – em alguns momentos – essa ajuda só seja possível pela oração. Avós entendem o estresse dos pais e sentem vontade de dizer “vai passar”, mas compreendem que há experiências que precisam ser vividas por pais e filhos. Nessas horas, avós se recolhem ao seu lugar e esperam a oportunidade de dar seus recadinhos, a uns e aos outros... Coisas que a vida ensinou.

Sendo avó, não sei definir o que é esse “estado de vida”. Faltam palavras. Só tenho certeza de que não foi à toa que Deus criou netos para avós e deu avós aos netos. Há um sentido muito forte nessa relação. Há uma porção sagrada nesse encontro. É algo que transcende tempo e distância e, mesmo quando ele vira saudade, é uma saudade recheada da alegria de quem acredita que a felicidade é possível. Amor de avós e netos não viram passado nunca!

Avós se alimentam de abraços e, quando eles não são possíveis, bebem das lembranças de cada momento em que o foram. Da mesma forma, os netos. Não existe encontro de avós e netos sem abraços...Aliás, não existia.... Nesses últimos dois anos, avós e netos tiveram que aprender juntos uma forma jamais imaginada de conjugar o verbo amar. E descobriram, juntos, que o amor mais profundo e verdadeiro abre mão do que parecia imprescindível, pelo bem do outro. Chamadas de video e beijos pela janela tomaram o lugar do abraço apertado e de todas as coisas especiais que só acontecem nas casas dos avós. A alegria partilhada nessas novas formas de encontro que fazem com que ambos celebrem a vida, às vezes, se deixa molhar por lágrimas que escapolem dos olhos de cada um. Chorar faz parte do exercício do amor! Nesse tempo, também, muitos avós e netos foram forçados – na marra – a aprender que as estrelas são, para nossos corações, ninhos de amor eterno. O Pequeno Príncipe dizia que “é lindo, à noite, olhar o céu e pensar que existe uma rosa sorrindo em algum lugar”. Eu digo que é lindo, à noite, olhar o céu, e sentir que existem avós habitando todas as estrelas. E que todos se juntaram, transformando-se em anjos, para cuidar de todos os netos que ficaram por aqui, cheios de saudade. Avós ensinam, estando em suas casas ou morando nas estrelas, que amar sempre vale a pena.

Avós conseguem juntar sabedoria e espontaneidade, risos e lágrimas, começo e fim, saudade e esperança, eternidade e presença, histórias e fantasias, frustrações e sonhos... E tudo com um toque especial de ternura, cuja receita só os avós têm. Avós trazem a certeza de que as histórias de amor não terminam porque são eternas. Por isso, toda história de avós e netos tem cheiro de café quentinho, de terra molhada, tem sabor de chocolate, de fruta tirada do pé.... Toda história de avós e netos tem o sabor e o cheiro que a gente quiser, sabores e cheiros que nos fazem viajar para um lugar especial, que nada nem ninguém pode tirar de nós, o “fantástico mundo do Para Sempre”.

quinta-feira, 15 de julho de 2021

Saudade

 





Saudade que aperta o peito,
certeza de um amor sem fim, 
amor tão lindo, amor-perfeito,
flor que habita dentro de mim.
Cria um jardim que transpõe as barreiras
de tempo e de lugar,

lembrando ao meu coração

que, quem pisa nesse chão

aprende que sempre, sempre

vale a pena amar.


Saudade que,
para além da dor da ausência,

tem sabor de eternidade;

pulsa no ritmo da essência

de tudo o que, juntos, transformamos

em realidade.

Saudade que minimiza

dores, dissabores, tristezas

e, feito um sopro, eterniza

as cores da beleza,

da parceria, da alegria

e da verdade.


Saudade, presença,
pertença, carinho.
Saudade, permanência,

transcendência,

caminho.

Saudade que faz rir

e faz chorar

e traz para dentro da gente

a imagem da semente

que morre para germinar,

faz-se flor que desabrocha

e se transforma

para doces frutos nos entregar.